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quinta-feira, 1 de agosto de 2013

Agosto - Morte de meu pai



Agosto, mês longo, dizia meu pai. Assim como ninguém, meu pai sabia identificar o tempo e as coisas. Quase sempre acertava. Dizia sempre: “a vida ensina”, “a vida ensina”. Certamente, ensinaria a evitar pancadas e tropeções que tantas vezes a vida nos reservara.
Não tenho muitas memórias de meu pai. Tenho vagas lembranças da única viagem a Campos de Jordão, uma excursão. Lembro-me do meu pai descendo do ônibus com uma travessa de torta de frango que minha mãe fizera para nós, pois naquele momento não tínhamos dinheiro para comer em restaurante. Durante a viagem, sem muito conforto, meu pai ia perguntando se eu estava gostando. Ele sempre recorria ao bom humor para que achássemos graça no passeio e para evitar frustração, quando percebia pela nossa expressão que as coisas não iam bem.
Era sempre assim, uma mistura de alegria e tristeza, calmaria e tempestade, lágrimas e risadas, dor e aconchego. A fim de disfarçar sua emoção em meu casamento, pois minha mãe se recusara a ir, por razões que não caberiam nestas memórias, pediu-me que, logo que eu chegasse à igreja, aguentasse bravamente sua ausência, porém, ele foi o primeiro a desabar.
Lembro-me do meu pai como uma presença alegre, fazendo graça para o divertimento da criançada no corredor de nossa casa. Eu gostaria de ter sentado mais ao lado dele, no grande banco de madeira, feito por meu avô, para ouvir sempre as mesmas histórias: contava que tinha sido oferecido, por minha avó, às pessoas que iam vender coisas em sua porta, mas que sempre fugia e voltava pra casa. 
Recordo também meu pai bêbado, com bigode e sobrancelhas atrapalhados cantando uma canção, que até hoje eu canto pra minhas netas; “quando eu morrer, me enterre na caixinha, de paletó e gravatinha”. Quando bebia ficava bravo ou triste. Melhor era não ficar próximo dele.
Herdei dele o amor pelos animais. Assim como ele já criei galos, galinhas, pássaros, gatos e cachorros. E hoje em dia, muito tempo depois, sinto o mesmo prazer de cuidar dos animais e apreciar o canto dos pássaros.
Com o meu pai aprendi a gostar de levantar cedo para trabalhar, a ter compromisso com o trabalho, a gostar de ouvir músicas caipiras, a colecionar moedas , a gostar das coisas simples ...
Enfim, apesar de seu temperamento, de sua maneira de agir, era simples e sábio. Tinha aprendido com a vida.

P.S. Meu pai faleceu em Agosto/1998

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